Lenda das Amendoeiras em Flor
Era uma vez, há muito muito tempo antes da independência de Portugal, quando o Algarve ou Al- Garbh ainda pertencia aos Mouros, reinava Ibne-Almundim, guerreiro temível que nunca tinha conhecido uma derrota.
Ora, um dia, após mais uma batalha da qual saiu vencedor contra um senhor dos países do Norte, surgiu, perante os prisoneiros, uma linda princesa. Cedo o Rei apaixonou-se por essa beleza nórdica de nome Gilda. O amor foi correspondido e marcaram logo casamento.
Porém, apesar das festividades e do seu amor pelo califa, a princesa ia ficando cada vez mais triste e melancólica até que um dia já não conseguiu levantar-se da cama.
Apavorado, o rei mandou chamar todos os sábios do país para que encontrassem uma cura de tão estranha doença que se tinha apoderado da sua amada. Mas nada conseguiram para melhorar a saúde da princesa.
Até que um dia um velho poeta nórdico prisioneiro do rei, em troca da sua liberdade, disse que sabia de que mal sofria a princesa. Revelou então ao Rei que a bela Gilda sofria de nostalgia da brancura dos campos cobertos de neve do seu país natal.
O rei ordenou então que plantassem junto ao palácio milhares de amendoeiras para que quando florissem cobrissem a terra de um manto branco. Ao chegar a primavera, o rei levou a princesa até à janela do terraço, que maravilhada com tão lindo espectáculo, conseguiu iludir as saudades, recuperando a vontade e alegria de viver.
Fonte: MARQUES, Gentil Lendas de Portugal Lisboa, Círculo de Leitores, 1997 [1962] , p.Volume III, pp. 205-211
Tempo da Lenda das Amendoeiras
(…)
A Princesa
Ai portas do meu silêncio.
Ai vidros da minha voz.
Ai cristais da minha ausência
da terra dos meus avós
desatavam-se em soluços
os seus cabelos desfeitos.
(…)
O Rei
Dizei-me magos oragos
anões duendes profetas
adivinhos e jograis
sagas videntes poetas
como hei-de secar o pranto
daqueles olhos de rio
como hei-de calar os ais
daquela boca de estio
como hei-de quebrar o encanto
que numa tarde de pedra
talhada pela tristeza
selou com dedos de chumbo
o sorriso da princesa
que suspira pela neve
da ponta do fim do mundo.»
in SANTOS, Ary dos. – Tempo da Lenda das Amendoeiras. Lisboa, 1964.
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