Inês Professora Leonor Machado_Editde Castro terá nascido na Galiza, segundo a tradição em Monforte de Lemos, filha ilegítima de um importante guerreiro galego, D. Pedro Fernandez Castro, apodado de “o da guerra”, e de uma dama portuguesa, D. Aldonça Valadares. Como aia de sua prima, D. Constança Manuel, veio para Portugal em 1340, para o casamento desta com o Infante D. Pedro. Segundo a crónica e a tradição, despertou intensa paixão ao Infante, devido à sua extrema formosura, como declara o único cronista contemporâneo, Pedro Lopes de Ayala.

Estes amores cedo foram notados, levando o Rei D. Afonso IV a exilá-la para o castelo de Albuquerque, na Extremadura castelhana, que pertencia a uma sua tia. D. Constança morreu em 1345, ao dar à luz o futuro rei, D. Fernando, e logo D. Pedro trouxe Inês de volta a Portugal. Juntos viveram em diversos pontos do país, pelo receio que o Infante tinha de qualquer intervenção do pai. Tiveram entretanto quatro filhos, o mais velho dos quais morreu em criança. Nasceu a tradição de um casamento secreto em Bragança, em 1352/53. Ambos da linhagem real dos reis de Castela, a partir de D. Fernando III, o Santo, este casamento exigia dispensa papal, um dos problemas que ainda hoje é debatido.

Finalmente instalaram-se no antigo paço da Rainha Santa Isabel, anexo ao Mosteiro de Santa Clara-a-Velha, em Coimbra.

Segundo alguma tradição, Inês não era benquista do povo, que via nela uma representante da vizinha Castela, inimiga permanente. Dois irmãos, que tal como o pai tinham servido D. Pedro I de Castela, tiveram desavenças com esse rei e refugiaram-se em Portugal, onde conspiravam com outros nobres castelhanos para derrubar o rei. A sua convivência com o rei português, a quem tentaram convencer a chefiar esse movimento, tal como conta Ayala, possivelmente com a promessa de juntar as duas coroas, suscitava grande desagrado, que recaía sobre Inês. Era uma empresa muito arriscada para Portugal, cujas forças eram muito inferiores às de Castela. Inês era vista como intermediária destas relações, significando portanto um perigo real para a independência portuguesa, tão dificilmente conquistada e ainda pouco segura. A política sobrepôs-se a tudo, e, numa altura em que o Infante estava longe de Coimbra, numa caçada, reuniu-se o Conselho de Estado no castelo de Montemor-o-Velho, e o Rei foi convencido a assinar uma sentença de morte contra Inês. A comitiva real deslocou-se a Coimbra, e Inês foi degolada, como convinha à sua qualidade nobre, no dia 7 de Janeiro de 1355, e logo enterrada na própria igreja do convento. Ao regressar, o Infante deu largas ao seu desgosto desencadeando uma guerra civil que destruiu sobretudo o Norte do país, zona onde se situavam as propriedades dos membros do Conselho que considerou os principais instigadores daquela morte, propriedades essas que foram totalmente incendiadas. Com a mediação da Rainha e do Arcebispo de Braga, foi possível conseguir que o Rei e o Infante assinassem um “pacto de amnistia e concórdia”, no Porto, no dia 5 de Agosto. Nele o Infante se comprometeu a perdoar àqueles que considerava os mais responsáveis pela morte de Inês.

Conhecendo bem o filho, D. Afonso IV, ao sentir-se morrer, aconselhou três desses homens, que, a partir da narração deste episódio por Camões, em Os Lusíadas, passaram a ser conhecidos como os “matadores” de Inês, a fugir do país, o que eles fizeram, refugiando-se em Castela.

Ao subir ao trono, D. Pedro começou a organizar a reabilitação de Inês e a sua vingança.

Em 12 de Junho de 1360, em Cantanhede, o Rei convocou as autoridades da sua corte e do país e proclamou, registando-o com a necessária documentação, o casamento com Inês realizado em Bragança pelo na altura deão da Sé da Guarda e agora seu bispo, na presença de Estevão Lobato, um seu criado. Assim declarou Inês rainha e seus filhos legítimos infantes. Entretanto, negociou com o vizinho e primo D. Pedro de Castela a troca de exilados nos dois países. Um dos três portugueses foi avisado e conseguiu fugir para Navarra, mas os outros dois foram levados a Santarém, onde o Rei assistiu durante o almoço à morte dos dois homens, a quem, em vida, foi retirado o coração, um pelo peito e outro pelas costas. Os seus restos foram queimados.

Nesta altura, D. Pedro mandou erigir no Mosteiro de Alcobaça dois túmulos majestosos que superam tudo o que se encontra na Europa. Logo que o de Inês ficou pronto, encenou o último acto desta tragédia. Mandou retirá-la do lugar onde fora enterrada em Coimbra e vesti-la ricamente. O que restava de Inês foi então levado em procissão nocturna por entre círios levados acesos ao longo de todo o percurso de 17 léguas até Alcobaça, onde foi depositado no seu túmulo definitivo, com toda a pompa real, à direita daquele que, já nessa altura (2 de Abril de 1361 ou 1362) estava a ser preparado para o Rei.

A literatura castelhana do século XVI fez preceder a descida ao túmulo de uma coroação do cadáver, mas seis anos passados sobre a morte, isso seria impensável, além do facto de Inês ter sido degolada. Já proclamada rainha, a coroação que lhe faltava consumou-se com o fechamento do túmulo, onde vemos a estátua jacente, coroada e encimada por um baldaquino. Assim viu o caso o primeiro poeta português que conhecemos como autor de um poema (“Trovas à morte de D. Inês de Crasto”, de Garcia de Resende, 1516) e assim foi geralmente aceite pela tradição portuguesa, com raras excepções sobretudo no teatro do século XVIII, muito influenciado pelo castelhano, sobretudo Reynar después de morir, de Vélez de Guevara, anteriormente a 1644.

Encontramos obras literárias de todo o género em praticamente todas as línguas europeias, e também hebraico, numa produção que ainda hoje não dá sinais de parar. Óperas várias continuam a ser escritas, bem como outras formas musicais e de outras artes, sobretudo pintura e escultura.


Professora Doutora Maria Leonor Machado de Sousa